A partir dali, escrevia-se uma nova página do black metal brasileiro. E o AMEN CORNER foi, sem dúvida, um dos grandes responsáveis por popularizar o estilo no país. Se antes quase não se ouvia falar de bandas do gênero, pouco tempo depois o cenário se transformaria.
Em 1993 a banda lançou seu debut: Fall, Ascension, Domination. Um álbum que, para mim, permanece insuperável. Confesso que, na primeira audição, não gostei. A produção me soou estranha, e o vocal, cheio de efeitos, parecia baixo demais na mixagem. Mas logo depois me vi completamente viciado.
Fall, Ascension, Domination não é apenas o primeiro registro do AMEN CORNER — é um manifesto. O álbum combina agressividade extrema com claras influências de doom metal, criando uma atmosfera própria, intensa e abrasileirada, distante da frieza do black metal norueguês. A produção é crua, mas mantém clareza: as guitarras cortam como lâminas, a bateria soa ríspida, e a voz de Paulista é um grito de guerra contra qualquer resquício de luz.
Essa fusão de peso, melancolia e densidade era, aliás, uma característica marcante do black metal brasileiro da época: músicas carregadas de atmosfera sombria e introspectiva, que conviviam com a agressividade típica do estilo. Para mim, essa combinação de brutalidade e lirismo sombrio foi o que deu ao AMEN CORNER — e a muitas bandas do cenário nacional — uma identidade própria e inconfundível.
Para
quem viveu aquele momento, o disco significava muito mais do que música: era
uma senha de pertencimento. Ter Fall, Ascension, Domination
na coleção era como carregar um brasão, um atestado de que você realmente fazia
parte do underground.
Amen Corner no lendário "Passport to Hell" (1994). Foto: Facebook |
Eu fui um desses fãs de carteirinha. Escutava o álbum sem parar, decorava cada letra, vivia aquela música como um evangelho sombrio. Até que veio o batismo real: o show em Bauru/SP, no festival Passport to Hell. Eu tinha apenas 16 anos e nunca havia pisado em um evento underground de death e black metal. Aquilo foi o paraíso. O público era exatamente como eu sonhava: cabelos longos, roupas pretas, camisetas de bandas obscuras que não eram do mainstream.
Tive
a chance de conhecer os músicos e até me senti importante quando um dos
guitarristas me convidou para tomar uma cerveja no bar. Eu só pensava: “ninguém
vai acreditar quando eu contar isso”. Guardo até hoje a lembrança de quando
ofereci um copo de vinho a Tito — hoje rebatizado como Murmúrio. Ele recusou,
berrando que “não tomava sangue de Cristo!”. Rimos. No geral, todos foram
simpáticos e acessíveis. Com exceção do vocalista Paulista, que mal levantava
os olhos para falar duas ou três palavras. Na época, achei-o um mala sem alça.
Talvez a evidência em que a banda se encontrava tivesse subido à cabeça. Curiosamente, anos depois, quando o entrevistei no meu saudoso Heavy
Nation, encontrei um sujeito bem mais simpático.
Aquela noite ficou
marcada. Se pudesse, voltaria no tempo para reviver tudo. Porque o metal
daquela época ainda era cru, intenso, sem as diluições que viriam depois. Não
havia new
metal, não havia emocore. E a Galeria
do Rock fervilhava de lojas de discos e headbangers, não dessa mistura de estilos que
hoje ocupa o espaço. Era um outro mundo, e o AMEN CORNER estava no centro dele.
Que fique claro: não tenho nada contra new metal ou emocore. Só que, para mim, eles não tinham a ver com aquele universo específico em que eu estava mergulhado.
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